Arcade? Meu Nome é Fliperama, Porra! (ou, Como Jogos Sempre Foram Sociais, Mesmo Antes de Saberem Isso).

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fliper

Muito se fala sobre o aspecto social dos jogos, em como os jogos eletrônicos aproximam as pessoas, como estimulam as experiências em grupo, e tudo o mais. Que há modalidades de jogos que estimulam o aspecto gregário dos humanos, entre outras coisas.

Muito já foi escrito sobre isso, e isso é, em geral, verdade. Agora, há diferentes aspectos de agregação social, e é interessante ver como eles diferem.

Os jogos eletrônicos tiveram como berço a experiência em grupo. Durante algum tempo, era impossível jogar eles sozinho: sempre era preciso de um segundo jogador. O clássico Pong é o exemplo mais claro dessa filosofia inicial. Claro que isso se devia mais às limitações técnicas e à necessidade de espelhamento (para reduzir o tamanho dos jogos) do que por visão de jogabilidade. Foram anos de gente se acotovelando ao redor de pequenas telas monocromáticas em disputas ferozes entre poucos pixels.

pong

Sim, só dois jogadores. Sim, não tem botão.

Com o aumento da capacidade de processamento e, principalmente, a chegada dos consoles domésticos, nasciam os jogos single-player. No Atari/Odyssey eles eram praticamente inexistentes, mas com o advento dos 8-bits, começamos a ter as experiências voltadas para um único jogador, meio contemplativas, como nos Zeldas e Final Fantasies. Estes foram os verdadeiros avós do single-player, já que esta é uma experiência totalmente voltada para essa modalidade.

Eu nasci junto com o Atari 2600. Tinha 4 anos quando meu pai trouxe um console americano contrabandeado para a família. Eu sofria um pouco, pois não havia muitos jogos single -player, e havia uma certa relutância de minha família (principalmente dos irmãos) em jogar com o molequinho. Então, enquanto os jogos favoritos deles eram os mais sociais, como Combat, eu adorava jogos como River Raid, Hero, Pitfall e Missile Command. Eles permitiam que eu me divertisse por conta própria, sem precisar da ajuda de ninguém, e foram com esses jogos que eu descobri uma paixão pelos jogos eletrônicos. Lembro-me até mesmo de viajar, pensando em como seria legar ter um fio que ligasse meu Atari ao de outras pessoas (até no exterior, quem sabe!) e permitisse que jogássemos juntos, mas separados. Demorou um pouco até meu sonho ser realizado.

O tempo passou, os consoles ficaram mais poderosos, as experiências de jogo mais diversas, mas ainda havia um lugar onde o que importava mesmo era a experiência de grupo. Onde o que valia era mostrar que era bom em público, onde qualquer um poderia lhe desafiar, e ai de você se pedisse para o cara não entrar! Uma das maiores marcas de vergonha era bloquear o slot de fichas com a concha, choramingando que aquela era sua última ficha!

Sim, era o glorioso fliperama. Um lugar maldito, de má reputação (em grande parte merecida), uma verdadeira arena de PVP, só que ao vivo e em cores. A regra era simples, quanto mais fichas comprava, mais barato era jogar. Bater em gente atordoada em jogo de luta era pecado mortal, salvo acordo anterior. Mexeu no controle de quem está jogando, morreu. Banho era opcional, mas bastante desejável, apesar de ser uma verdadeira estratégia de combate de certos garotos de rua ou babacas.

Fliperama que se prezasse não tinha comida ou bebida, bancos para se sentar (a não ser aqueles bancos de madeira altos, em alguns lugares, disputados a tapa), conveniência, banheiros decentes, iluminação saudável, circulação de ar, etc. Era um verdadeiro antro insalubre. E a gente adorava aquilo.

Curve-se perante a poderosa Ficha de Fliper!

Curve-se perante a poderosa Ficha de Fliper!

A conservação das máquinas seguia muito a infraestrutura do lugar, mas isso é uma das poucas coisas que variavam bastante: em geral, os fliperamas do centro de São Paulo eram salões retangulares enormes, no nível da rua ou no primeiro subsolo, de chão frio e iluminação branca (que invariavelmente ficava piscando, semi-hipnoticamente). Esses fliperamas eram grandes, e esse era um grande atrativo: havia uma variedade grande de máquinas, e muitas vezes, era possível encontrar títulos mais obscuros, verdadeiras pérolas que gravavam seus logotipos de forma indelével nos monitores CRT dos gabinetes. Outro atrativo desses lugares era o preço: muitas vezes, era possível gastar de 30 a 50% a menos nesses locais. Mais até, se você conhecesse o “tio da ficha”. E lhe garanto: os garotos de rua daquela época podiam ser analfabetos, mas eles era experts em tabuada, graças à dança das fichas e da inflação pré-plano real. Faziam cálculos com uma rapidez invejável.

Nesse tier de fliperama, talvez o maior diferencial era o controle das máquinas. O bom jogador de fliper não se importava em pagar um pouco mais ou se deslocar para um fliper mais distante para jogar sua máquina favorita com controles lubrificados e todos os botões funcionando. Pouca coisa matava fliperamas naquela época, e ter consistentemente controles zoados era uma delas. A reputação de manutenção das máquinas espalhava-se com uma rapidez surpreendente, em uma época sem celulares ou internet. Abriu um fliper em Diadema com Samurai Shodown 2 com tela grande e controles legais? Em menos de um dia todo mundo sabia disso. Boa parte iria até lá, conferir o boato.

Exemplo clássico de fliper sujão, o melhor de todos. Nem precisa ir se não estiver de bermuda.

Exemplo clássico de fliper sujão, o melhor de todos. Nem precisa ir se não estiver de bermuda.

Havia um segundo tipo de fliperama, mais comum em bairros  de poder aquisitivo um pouco maior. Ele era menor (pois ficavam em lugares onde o aluguel era mais caro e cada metro quadrado fazia a diferença), tinha menos máquinas e era voltado a uma seleção menor de jogos, em geral um ou no máximo dois gêneros. Nestes fliperamas era possível, de vez em quando, encontrar cascos originais de certos jogos, como Simpsons, X-Men, Teenage Mutant Ninja Turtles, fora do ambiente de Shopping Center.

Os fliperamas de Shopping eram um animal à parte, pois além de serem caríssimos (a proporção em geral era 1 ficha de shopping para 10-15 fichas de fliper de rua), possuíam uma seleção MUITO limitada, e o preço muitas vezes não condizia com a manutenção (estou olhando para você, Playland do Shopping Paulista). A sua única qualidade que os redimiam eram cascos originais de vários jogos, e eventualmente uma máquina importada quase que simultaneamente com o exterior. Quando a primeira máquina original de Killer Instinct chegou ao Brasil, na Paulista, com o casco original e caixas de som bombando aquela maravilhosa trilha hard pop, todo mundo percebeu. A máquina havia chegado em uma Terça Feira. Houve um sensível aumento no número de faltas de todos os colégios da região pelo resto da semana. Eu conhecia os donos de banca da Paulista na época, e peguei uma edição da GamePRO com uma matéria de apresentação do jogo e…. códigos de Ultra Combo e Ultimate para alguns personagens (dentre eles o Sabrewulf, meu favorito). Caros leitores, comprei aquela ficha (caríssima) com a confiança de um tenente que adentra um quartel de recrutas. Ninguém sabia quase que golpe nenhum, era tudo na intuição. Esperei a vez de um desafeto antigo meu, perguntei polidamente, com um meio sorriso: “Posso?”, entrei contra e dei uma surra tão acachapante na criatura que ele perdeu o rumo. No final, a humilhação suprema: combo longo, Ultra Combo e air juggle. Sem brincadeira, parecia cobrança de pênalti em final de Copa do Mundo. Todo mundo berrando, soltando expletivos humildes como o já clássico: “Yééééeéééé!”, além de palavrões sortidos. O cara anda teve a manha de entrar contra de novo para tentar lavar a honra, manchada de forma indelével, só para tomar um round Perfect, um Combo Breaker, e o Ultimate em que o Sabrewulf cresce as garras e enfia no bucho do inimigo, no melhor estilo Mortal Kombat. Lembrar disso coloca um grande sorriso em meu rosto. Foi um bom dia!

Mas, tirando essas situações extraordinárias, o fliperama de Shopping era uma aberração, e não conta para o que estou descrevendo aqui. Era uma excentricidade, em meio à rotina e constância de nossos amados fliperamas de rua.

Os fliperamas da Liberdade eram o paraíso dos jogos de Luta, pois era raro encontrar as franquias laterais de luta da SNK (como Last Blade, Waku Waku, e até mesmo World Heroes e Real Bout) fora de lá. De forma coadjuvante, havia grandes shmups, também da SNK, como Prehistoric Island, Aero Combat, etc. Já o centro era o local de se jogar jogos da Capcom e Konami, além de platformers, como Darkstalkers (impossível de achar na Liberdade), Rygar, Ghost and Goblins, e vários Beat’em Ups, como Vendetta, Cadillacs and Dinosaurs. Em lugares com muito tráfego de office boys (como na 7 de Abril e alguns lugares estratégicos no entorno da Avenida Paulista), era comum encontrar máquinas de corrida, muito populares entre eles, como Daytona, Sega Rally, a série Cruisin’, Indy 500.

Gradius 2, que constantemente me levava ao desespero e ao nirvana.

Gradius 2, que constantemente me levava ao desespero e ao nirvana.

Eu tinha um mapa mental bastante complexo de todos os fliperamas que conhecia (que não eram poucos), e aí eu planejava o meu dia de jogatina de acordo com a minha vontade do dia. Em geral, eu ia à Liberdade só nos fins de semana, para economizar condução. Em compensação, eu ficava lá o dia inteirinho, e era muito comum ser expulso pelos donos do fliper que estavam fechando, só para descobrir que já era 1 da manhã e não havia mais ônibus para casa.

É difícil descrever a importância dos flipers na minha formação. Eu ia neles desde MUITO jovem, tipo 6, 7 anos. Quando meu pai morreu, eu tinha 9 anos, e esses ambientes foram importantes para a minha educação social, financeira, diplomática e psíquica. Eu aprendi muito sobre a natureza humana, sobre como saber ganhar e perder, sobre como gerenciar meu tempo e dinheiro, sobre como me impor perante pessoas hostis, sobre como agradar e ser popular. Tudo isso em lições que custavam 10 centavos a ficha.

Havia, claro, o lado negro. Sempre há. Havia a presença de drogas, bebida, gente abusiva, violência, corrupção, e comportamentos obsessivos e limítrofes. Precisei brigar algumas vezes (não me orgulho disso), precisei sair correndo tantas outras. Tive que jogar moleque de rua drogado, completamente chapado e com caco de vidro na mão, para longe, de forma a não machucar a ele e a mim mesmo. Já enfiei valentões folgados na caçamba de lixo, head first (ok, disso eu me orgulho). Já bati e já apanhei. Mas eu sempre tive um approach bastante sensível em relação às maiores roubadas, e hoje, em retrospecto, me surpreendo com quão maduro e sensato eu fui durante aqueles anos.

Tenho certeza que aquele fliper é por aqui!

Tenho certeza que aquele fliper é por aqui!

De quebra, você conhecia figuras espetaculares, que poderiam figurar em qualquer livro do Nélson Rodrigues ou Plínio Marcos. Era um desfile de apelidos folclóricos, de gente que hoje eu sinto saudades: Negão, Fung Ku (o terrível japa fanho), Orêia (em pelo menos duas incarnações diferentes), Croquete, Nevasca, Manja Rola (terrivelmente vesgo, mas jogava platformers como poucos), Alemão, Cruzcredo, Chun-Li, etc, etc. O que eu não daria para juntar essa galera em uma mesa de bar, para relembrar histórias que a maioria das pessoas achariam que era mentira.

Cada uma dessas figuras tinha suas particularidades e áreas de especialização. Nesse quesito, eu era meio raro, pois jogava bem shmups e platformers, e não fazia feio nos jogos de luta (em especial aqueles que tinham personagens lentos e fortes). Essas pessoas tinham seus jogos favoritos, e você só era aceito ‘de verdade’ na subcultura fliperamística se você acabasse algum jogo ‘de respeito’ com uma só ficha. No meu caso, meu troféu era acabar os 3 primeiros Gradius (Salamander) consistentemente com uma só ficha. Além disso, sou a única pessoa que vi acabar Prehistoric Island com um crédito só. Era um prazer assistir os mestres jogando seus respectivos jogos, mostrando suas táticas e manhas (como as caronas nas costas dos gárgulas voadores nas fases de cachoeira do Rygar), e também jogar com platéia. Ver as pessoas comentando ali, do seu lado, e acabar um jogo desafiador com seus pares ao redor é uma marca de orgulho muito grande.

O Rygar original tem mais segredos que namorada internética.

O Rygar original tem mais segredos que namorada internética.

Tudo isso é uma ilustração de como os jogos são fatores de agregação social, ajudando a organizar uma população e suas relações, de forma saudável (em sua maior parte), mesmo sem o elemento digital, online, instantâneo que temos nos jogos de hoje.

Jogadores de MMO em geral, eu espero honestamente que vocês tenham experiências sociais ricas envolvendo seus jogos e seus círculos de amigos jogadores, da mesma forma que eu tive, no passado. Caso contrário, vocês perderam uma fatia bastante saborosa do ‘ser jogador’.

Mantenha seus amigos próximos, mesmo à distância.

Mantenha seus amigos próximos, mesmo à distância.

Muita água sob a ponte.

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Nossa… já são quase 3 anos que eu não posto aqui. O Jason que escrevia aqui, apesar do relativamente pouco tempo, é coisa do passado. O Jason atual é pai de uma linda mocinha de 1 ano e 8 meses, Community Manager de uma nova Publisher no mercado nacional de jogos online. Continua gordo e feio. Afinal, nem tudo muda, não é mesmo?

Esse hiato mudou muito a minha pessoa, e o mercado de jogos (nacional e mundial) mudou bastante também. Quando eu comecei o blog, o único MOBA de destaque era o DotA 1, ainda bem nicho. Hoje temos o gigante League of Legends roubando o título de MMO com mais gente logada simultaneamente do mundo. O MMORPG caiu um pouco de visibilidade, e jogos com uma proposta mais rápida, a serem consumidos em cápsulas de tempo menores, hoje são bastante populares.

Ou seja, há muito sobre o que se conversar =)

Minha rotina de trabalho continua insana, mas vamos ver se consigo arrumar tempo para postar com alguma regularidade.

J.

Voltando à ativa…

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Após uma longa pausa, queria retomar um ritmo de postagens mais regular.

E, assim, pergunto a vocês, leitores: O quê gostariam de ver discutido aqui no meu blog? Deixem suas sugestões nos comentários, e vou tentar atendê-los na medida do possível.

J.

Lost in Translation

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Erros de tradução nos perseguem desde o início dos Vídeo Games.

(Após um período de trabalho intenso e em convalescença de uma broncopneumonia que quase me transformou em modelo de passarela para Faculdade de Anatomia, espero manter o ritmo de postagens mais constante agora.)

Tradução é que nem festa de casamento: não importa o quanto você se esforce para fazer o melhor, todo mundo sempre vai achar que foi uma porcaria.

Isto talvez nunca tenha sido tão verdade quanto o inferno vernacular vivido pela poderosa Blizzard quando ela começou a divulgar amostras de seu conteúdo em Português. Primeiro foi a versão de páginas de seu portal em Português, onde era possível descobrir que o famigerado Lich King era, na verdade, o Tinhoso.

Depois, foi o lançamento do Starcraft II, grande título de RTS, cujas escolhas de tradução encontraram bastante reservas (inclusive minhas). Unidades como Endiabrado (Hellion, heh), Vudu (pobre Banshee…), Mammuthus (Pobre Ultralisk), criaram um impacto muito negativo em uma parte considerável da fanbase do jogo.

Eu, como tradutor profissional, não vou entrar neste mérito. Não é possível traduzir somente baseado em emoção ou vínculo afetivo. Mas uma boa tradução precisa ter algumas coisas: paralelismo, consistência e contexto.

Um bom exemplo de contexto usado para o bem da tradução encontra-se no próprio Starcraft 2: Zergling virou Zergnídeo. Uma tradução perfeita. Afinal, Os Zergs são insectóides (e por isso, o sufixo ‘nídeo’ substitui com louvor o sufixo do Inglês ‘ling’). A tradução foi feita, e o contexto foi respeitado. A história e a consistência do Universo do jogo agradecem. Porém, o mesmo tratamento não foi dispensado ao pobre Baneling, que virou…. Tatu-bomba. Tatu-bomba, não. O paralelismo de terminologia foi quebrado (aqui o sufixo ‘ling’ não recebeu a tradução de ‘nídeo’), sem nenhum benefício aparente para tanto. O contexto histórico do jogo perde muito com um nome destes. Aqui, a opção foi por uma tradução estilo “Sessão da Tarde”. Dica para os tradutores de plantão: não subestimem a inteligência de seu público. Ainda mais uma comunidade aficionada como a de um Starcraft. A gente entende o que o Baneling faz. Não precisa desenhar. E a não ser em casos muito excepcionais, nomes de fenômenos culturais regionais (como ‘Banshee”, que nem Inglês é, e sim do Irlandês/Gaélico antigo, de Bean Sídhe) ficam como na grafia original. Não vale a pena mexer nestes vespeiros.

Traduzir jogos e qualquer tipo de produto cultural altamente especializado (como RPGs e certos quadrinhos) é uma tarefa MUITO difícil. Dar um trabalho destes para um ótimo tradutor de literatura não quer dizer que a tradução ficará boa. Este tradutor muito provavelmente irá pender para uma tradução literal, que certamente irá desagradar a quem mais importa: o consumidor daquele texto. É aquela velha história: você não iria dar um contrato de joint venture de empresas para ser traduzido por um tradutor de documentários da National Geographic, não é? Por quê será que o mesmo não ocorre para jogos e congêneres?

E, por favor, eu já vi muita coisa bizarra traduzida em jogos ou manuais dos mesmos. Nunca vou me esquecer do manual do Lands of Lore lançado no Brasil… era inacreditável. Você sabe o que é uma “Corrente dos Correios da Luz”? Não, não é um daqueles esquemas “envie esta mensagem para 7 pessoas ou morra”. É uma simples “Light Chain Mail”. O manual do Neverwinter Nights original também tinha uma derrapada épica. Afinal, imagine que perigo você, em dia de Parada do Orgulho Gay na Avenida Paulista, empunhando uma “Espada Bastarda +1 contra Transformistas”? O original era “+1 Bastard Sword against Shapeshifters”. De Shapeshifter para Transformista, vai uma pequena diferença, não é?

A triste verdade é que tradução é vista apenas como custo, e não como investimento. O profissional da área é sempre pago com valores pífios, tendo condições e prazos muito ruins. Isto, claro, quando um profissional é contratado, pois muita gente acha que basta saber um Inglês “enrolation” que qualquer um pode traduzir qualquer coisa. Ou, claro, coloca lá no Babelfish e divirta-se com o resultado surreal da tradução automática.

Neste momento, eu estou traduzindo o Rappelz para a gPotato brasileira. E apesar de não ter grandes problemas em manter o paralelismo e o clima do jogo, traduzir um conteúdo grande destes sem muito referencial é bastante complicado. Uma grande dificuldade é a diferença entre número e gênero entre o Português e o Inglês. O Inglês é maravilhoso neste aspecto. Afinal, um “Summoner” pode ser tanto masculino quanto feminino. Mas o Português “Invocador(a)” já exige a diferenciação. Outro problema aparece traduzindo NPCs com nome adjetivado. Afinal, o tal “Summoner Rudmyou” é homem ou mulher??? Descontextualizado, termos como este são armadilhas. Muitas vezes dá para logar no servidor americano e tirar a dúvida, mas em partes mais obscuras do jogo, isto nem sempre é possível.

Encadeamentos de adjetivos e sufixos mágicos para armas e equipamentos podem, às vezes, criar problemas curiosos. Vamos estabelecer um padrão, como Item + sufixo. Assim, se você tiver um item “Espada Longa” e um sufixo mágico para armas “Cruel”, criamos itens como “Espada Longa Cruel”, certo? Agora um item como “Espada do Dragão” e um sufixo “Leve”… perceberam onde vamos chegar? “Espada do Dragão Leve”. Afinal, quem é “Leve”, o Dragão ou a Espada? Neste caso, temos que romper com o paralelismo e forçar a associação, com “Espada Leve do Dragão”. Fazer isto para milhares de combinações de itens não é tarefa das mais simples.

Por isso, da próxima vez que você jogar algo em Português e não se sentir ofendido com o que estiver escrito na tela, lembre-se de agradecer ao tradutor que pensou em você na hora de localizar em Português o seu jogo preferido.

J.

The Call of Duty

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Então, estou bastante ocupado com a tradução do Rappelz e com várias responsabilidades dentro da Gala, então estou meio ausente nestes dias. Assim que eu tiver uma folga, volto a postar coisas para vocês.

J.

Anonimato em Comunidade – Parte 2

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Havia 2 desfechos possíveis para o dilema vivido pela Blizzard e seu LiveID:

  • Insistir na idéia, implementar o uso de nome e sobrenome reais em seus fóruns, e receber todo o impacto negativo que a medida iria causar, inclusive pelo aspecto litigioso (lembrem-se, é nos EUA), ou
  • Recuar e admitir que o sistema é enormemente impopular, e que a implementação dele seria um tiro no pé.

Eles decidiram pela segunda posição, uma idéia acertada e que certamente será transformada em “veja como ligamos para vocês”. Ouvir seus clientes é importante. Ao contrário do que costuma-se dizer por aí, o cliente nem sempre tem razão: muitas vezes eles pedem coisas impossíveis ou simplesmente indevidas. Mas não se brinca com dados pessoais na Internet de hoje.

J.

Anonimato em Comunidade

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Estou acompanhando um embate que ocorre agora na Blizzard americana sobre o fórum daquela empresa (no ambiente Battle.net) e o anonimato de seus usuários. Quem quiser acompanhar, pode ver o anúncio oficial aqui.

A mudança proposta é que todo mundo que deseje postar algo nos fóruns seja obrigado a usar nome e sobrenome reais para poder fazer isto. Os usernames serão banidos, o máximo que você poderá fazer é ligar o nome de um personagem seu com o seu nome. Desnecessário dizer que a polêmica foi grande, e que houve uma maciça reação contrária a esta medida. Resta ver se a Blizzard irá prosseguir em sua decisão ou vai ouvir a sua comunidade.

É claro que a idéia já está sendo escrachada na Internet, como nesta tirinha muito marota.

Eu nunca implementaria uma medida como esta. Acho que ninguém é obrigado a postar seu nome real na Internet a não ser que deseje isto expressamente. Muitas pessoas não querem vincular o seu hobby (ou vício). Outros temem que o acesso ao nome real possa instigar assédio ou, em casos extremos, violência/pedofilia. Outros são tímidos, e querem se preservar. Outros ainda querem ter esta persona, como uma espécie de roleplay, com a qual ele possa assumir uma posição ou papel diferente do que escolheria na vida real.

O fato é: ninguém deve ser obrigado a se expor sem que haja uma necessidade real. Obrigar todos a postarem sob nome e sobrenome originais parece-me simplesmente a aceitação por parte desta empresa que eles não conseguem moderar seus fóruns, ou que o gasto feito para manter esta moderação é muito alto. De qualquer forma, é um tiro no pé, que vai esvaziar o que uma empresa de games tem de mais precioso: sua comunidade e a sua relação com ela.

O fato é que o ambiente da Internet é muito aberto, e deve permanecer assim. Dados pessoais só devem ser divulgados com expresso consentimento, ou em ambiente restrito, para fins comerciais, oficiais ou legais. As empresas devem sempre facilitar o acesso das pessoas à sua comunidade, e zelar para que este ambiente seja moderado e saudável. Tentar se esquivar desta responsabilidade é um erro. Anonimato não é privilégio na Internet: ele é um direito adquirido, e que precisa estar à disposição das pessoas que frequentam ambientes abertos. Quem gerencia comunidades precisa deixá-las mais acessíveis e amigáveis, e não forçar o bom comportamento de forma artificial. Se seus clientes sentirem confiança e uma presença forte da empresa na comunidade, eles vão se comportar muito bem, sem precisarem ser coagidos a isto.

Qualquer coisa diferente disto é assumir que você desistiu de sua comunidade, e que não está disposto a investir nela.

Não é fácil gerenciar comunidades. Não é fácil relacionar-se com seus clientes em um ambiente tão livre quanto a Internet. Mas é o mínimo que as empresas podem fazer, em respeito aos seus consumidores.

J.

EDIT: Lendo mais sobre o assunto, vi um estudante de Direito da Universidade de Harvard falando que a Blizzard talvez tenha tomado esta atitude por conta de uma lei sul-coreana de 2009 que exige que comentários online feitos em comunidades com mais de 100.000 membros sejam feitos usando o nome real da pessoa.

Esta teoria é absurda. A Blizzard é tão forte mundialmente que ela, sozinha, conseguiu abrir exceções para seus jogos online em certas leis de informática que regem o público de jogos na China, país que normalmente não é conhecido pela sua flexibilidade. Uma lei de outro país, ainda mais regendo comunidades (e não jogos) não iria influenciá-la tanto assim.

Jogador X Publisher. Round One, FIGHT!

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E mais uma batalha de morte é travada na Internet

Esse é um tema que sempre causa muita discussão no mundo dos MMOs: a relação entre o jogador e a publisher de um jogo. Esta relação nunca foi fácil em lugar algum do mundo, mas ela é especialmente virulenta no Brasil.

Mas, por quê?

É notório que o suporte e o atendimento à comunidade não se tornaram prioridades para as Publishers brasileiras exceto nos últimos tempos. Muitas empresas tentam hoje reconquistar a sua relação com os clientes, descobrindo a duras penas que é muito difícil reverter uma opinião negativa da comunidade.

Alguns fatores, entretanto, ajudam a explicar (mas não justificar) esta ausência de preocupação com a comunidade de jogadores do Brasil. Talvez a mais importante delas seja o custo deste suporte no Brasil. O mercado brasileiro cresceu muito nos últimos anos, mas ainda é uma pequena fração do mercado global de games. Os lucros obtidos sobre os jogos, pagos impostos, royalties e despesas com a equipe, ainda são relativamente pequenos. Assim, para quem não conhece a importância que a boa relação com a comunidade exerce sobre um produto, fica difícil justificar reduzir este lucro ainda mais com esta “despesa” extra. Para o burocrata, faz mais sentido colocar apenas um suporte técnico, e a comunidade que se acomode ao redor do jogo, como puder.

Esta visão é ultrapassada, e creio que nenhum profissional da área de jogos hoje duvide do poder que a comunidade (seus clientes) possui. Foi uma lição aprendida à duras penas, e que ainda traz benefícios tímidos para a área.

Na minha opinião, acho que este tipo de atitude criou um certo receio por parte dos jogadores, que é fácil de ver nas comunidades. As empresas de jogos, para parte significativa dos gamers, são inimigos da diversão deles, e desejam cobrar e ‘fechar’ o mercado, visando exclusivamente o lucro. Nessa hora, é preciso haver honestidade de ambas as partes:

  • Os jogadores, em sua enorme maioria, desejam jogar em paz e se divertir dentro do seu jogo escolhido. Eles querem que o produto funcione bem, que seja adequado à nossa realidade, e que tenha um preço de usufruto que eles considerem ‘justo’ (isto pode variar bastante). A maioria não faz questão de contato com a empresa que gerencia o jogo, mas se isto for necessário, ele quer que este contato seja ágil, eficaz e cortês.
  • A empresa de jogos visa crescer no mercado, ganhar mais representatividade, ter o respeito de seus concorrentes e prestígio junto aos seus clientes. A empresa visa o lucro, mas é raro a empresa ‘mercenária’, que faz apenas o mínimo necessário para o jogo rodar e pronto. O mais comum é ela não saber como fazer mais pelos seus clientes, por isso esta imagem de distanciamento que existe hoje no mercado.

Ambos os lados precisam entender que a outra parte não é um inimigo (como na imagem acima). Pouca empresas se preocupam apenas em ganhar dinheiro, não importa a área de atuação. Alguém duvida que empresas queiram ganhar dinheiro, mas também dar um retorno e uma boa experiência aos seus clientes? Em um ramo onde a proximidade entre empresa x clientes é tão grande como nos games, é um suicídio consciente ignorar maneiras de melhorar o seu suporte e contato com a comunidade.

As empresas também demoraram para entender isto, no entanto. Acho que elas acreditaram nas lendas que correm no mercado sobre os jogadores, e por isso evitaram dar grande atenção a eles, simplesmente por não saber quem são eles, o quê eles querem e como estabelecer um bom canal de comunicação. Nenhum jogador se engane: trabalha-se demais em uma empresa de games, e tem gente muito apaixonada cuidando de vocês. Mas, como em toda empresa, é preciso ter normas, sistemas, padrões e rotinas. Se o GM não pode resolver o seu problema do jeito que você imagina ser o ideal, não é porque ele está de sacanagem com você: confie no profissional do outro lado da tela. Seja cortês, descreva seus problemas ou dúvidas de forma clara e objetiva, e talvez você tenha uma boa surpresa. A boa comunicação é responsabilidade de ambos os interlocutores.

Acho que os consumidores precisam ser mais objetivos e diretos, e menos passionais. Também acho que as empresas precisam se qualificar cada vez mais e fazer a sua lição de casa.  Só assim poderemos mudar a cara desta relação. Todo mundo tem muito a ganhar com isto.

J.

CM? WTH?

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Oh noes, como é que o cidadão me escreve isso...

Esse é um post que precisa ser feito: o quê diabos é um CM? Eis uma dúvida muito comum, e que tem uma resposta bem complexa.

Basicamente, CM é o Community Manager (Gerente de Comunidade, em inglês) de um jogo ou de uma empresa.

Até aí, tudo bem. Mas o quê um CM faz? Quais as habilidades que um CM precisa ter? O quê ele pode oferecer para a sua empresa e seus clientes?

Antes de mais nada, é preciso dizer que a função de Community Manager praticamente inexistia no Brasil, e que tenho orgulho de ser um dos pioneiros na formalização do cargo no país. O máximo que havia antes era GMs com um vínculo mais descontraído com a comunidade do jogo em questão, e que tentava ajudá-los além de sua função. Acho que um bom exemplo disto foi o Oromë no jogo Ragnarok Online da Level Up! Games. Entretanto, ele não era CM, e sim GM de destaque pelo seu contato com a comunidade deste jogo. A função de CM em companhias de jogos online no Brasil simplesmente não existia, até onde sei.

Em companhias americanas de MMOs, a presença de um CM é relativamente comum, e o cargo é consagrado. Há muitos profissionais renomados e com muitos anos de casa, como  Meghan Rodberg, conhecida como “Patience”, CM do Lord of the Rings Online (Turbine-Warner), ou o Eyonix, do World of Warcraft (Blizzard). No caso deste último, que deixou a posição após 6 anos de casa, é fácil ver o poder e o respeito que um bom CM pode angariar lendo o post de despedida dele aqui. Foram mais de 1000 posts de agradecimento somente neste thread.

O CM precisa ser um profissional versátil, pois ele precisa:

  • Entender a filosofia da empresa onde trabalha e adaptar-se a ela;
  • Entender o produto pelo qual é responsável;
  • Conhecer seu público e dominar a forma correta de se comunicar com ele;
  • Fazer bom uso das ferramentas que dispõe e pesquisar formas de expandi-las.

Empresa:

Cada empresa tem sua filosofia de trabalho e objetivos. O CM precisa estar muito bem alinhado com tudo isto, pois ele é muitas vezes o porta-voz da empresa, e assim necessita estar em sintonia com o que é esperado dele, algo que é mais complexo do que pode parecer inicialmente. São várias camadas de adequação: vocabulário, frequência de contato, canais de comunicação, ideias transmitidas, conceitos éticos, etc. É muito fácil esquecer de considerar um destes fatores e cometer uma gafe, que em muitos casos pode ter consequências desastrosas para a empresa ou sua reputação junto aos clientes.

O bom CM transita por todas as áreas da empresa, e pode muitas vezes agregar muito a várias áreas da mesma. Assim, é importante ter conhecimentos em diversas áreas empresariais, boa dicção e escrita, e bastante cultura geral. Quanto mais o CM está ligado no que está ao seu redor, mais ele pode contribuir para o bom desempenho da companhia.

Produto:

O CM é o cimento que ajuda a ligar produto aos seus consumidores. Sem um conhecimento do que você está vendendo, é impossível trabalhar com eficiência. Nos MMOs, o produto é o jogo e seus agregados, e o CM tem que conhecê-los com bastante intimidade. Não é necessário um conhecimento técnico aprofundado do mesmo, como é esperado de GMs, mas ter este extra pode ser importante na hora de conceber premiações e eventos para o mesmo. Mas talvez o fator mais importante de conhecer o seu produto é o de fazer a ponte entre o consumidor e a empresa. Como receber as reclamações dos jogadores e repassá-las eficientemente dentro da companhia se você não tem um conhecimento profundo do produto? Não é possível, e o bom CM é conhecido por saber dos problemas e pontos fortes de seus produtos.

O CM precisa ter uma excelente competência linguística. É necessário saber transitar entre os níveis de escrita e fala, mas todo CM precisa ter um certo grau de academicismo ao se comunicar. Isto não é apenas um sinal de profissionalismo e competência, mas tem impacto direto na percepção do público sobre o produto e a companhia em que ele trabalha. É claro que ser a reencarnação de Camões não garante que alguém seja um bom CM, mas gente que constantemente se comunica com frases do tipo “Manoo, noso jogo é muito rox, deicha de ser nuba e vai upar, meol!!!1!” vai passar a imagem errada da profissão, do produto e de si próprio. Há espaço para coloquialismo e para a descontração, mas é algo que precisamos tomar muito cuidado.

O CM também é responsável direto pelas regras da comunidade (e muitas vezes, das dos jogos) e por sua moderação e aplicação. Este é um trabalho de fundo, sempre constante e que é o que há de mais “rotineiro” no dia de um CM. Por isso, é preciso evitar o erro de deixar estas regras escaparem de seu controle, ou de não aplicá-las com rigor.

Público:

Ser CM é trabalhar na ponta do atendimento, ou seja, com o público final de um produto. Você vai receber elogios, sugestões, críticas, xingamentos e muita, muita coisa aleatória em seu contato com a comunidade. Logo, é preciso saber filtrar toda esta informação e ligar ‘empresa + cliente’ com eficiência, evitando ao máximo ruídos nesta comunicação, e ter muita paciência e jogo de cintura no contato com o público. Dificultando ainda mais este processo (que já não é moleza), há o fato de grande parte das pessoas que entram em contato com você não saberem qual é verdadeiramente a sua função. É extremamente comum o CM ser confundido com GM e ser requisitado para a resolução de problemas que não estão em sua alçada, como questões sobre pagamentos, suspensões por infração e suporte técnico, por exemplo. Nessa hora, há duas possibilidades: direcionar o usuário para o canal certo de comunicação sobre o problema em questão, ou tentar fazer a ponte, você mesmo, entre o usuário e a área correta, ao mesmo tempo que é feita a instrução de como entrar com contato corretamente no futuro. Uma boa experiência por parte do usuário nunca é esquecida, e ajuda muito a consolidar (ou destruir) a reputação do CM e da empresa, em geral. Por isso, é de extrema responsabilidade a função de CM.

Ferramentas:

A Internet é um ambiente extremamente dinâmico, onde são criados e destruídos vários veículos de comunicação. Estar ciente destes movimentos  também faz parte das atribuições do CM, que precisa saber como maximizar os meios de contato sem criar ‘clutter’ e sem banalizar a mensagem. Assim, ele precisa levar para a empresa os meios de contatos mais eficientes, e saber usá-los bem. Também é preciso calcular quando um meio ficou obsoleto, e quando deve ser substituído por outro mais adequado.

Saber mexer em vários tipos de software (e às vezes até hardware) também é parte da expertise em ferramentas que o CM precisa dominar. Editores de texto, imagem e vídeo, além de ferramentas administrativas internas são bons exemplos de softwares importantes para o bom exercício da profissão.

Outras considerações:

Já é meio clássica a imagem de CM como “forum monkey”, o que não corresponde com a realidade. Fóruns certamente são muito importantes, mas como já descrevi acima, são apenas uma parte da função do bom CM. Ele precisa transitar entre comunidade e companhia, e tem que dar satisfações para os dois, o que é algo difícil de fazer em certas situações. Também precisa ser idôneo e ético, pois é uma posição de poder na empresa e na formação de opinião, e que tem impacto econômico direto sobre o lucro da empresa. O CM é responsável direto pela preservação da marca de uma empresa, um de seus bens mais valiosos.

Muitas vezes, também precisamos cuidar de funções como recrutamento, organização e participação presencial em eventos, documentação/tradução, criação de conteúdos relevantes, seleção de produtos/ferramentas. Em pelo menos uma situação, já tive que ser enfermeiro e torneiro mecânico =P.

Ser a voz da empresa também carrega outras responsabilidades, e por isso, paciência é uma qualidade de ouro para o CM. Na maioria das vezes, a comunicação ocorre via Internet, e todos sabemos que este meio é propenso a amplificar a sensação de anonimato e de poder de seus usuários. Educação, cabeça fria e bom-humor são nossas maiores armas e, quando bem utilizadas, dão conta de quase toda situação. O CM é como um pai austero: ele dá as boas notícias e as más notícias, e tem que fazer as duas coisas de forma correta e serena. Um grande erro é querer ser amado por todos, e deixar que esta vontade prevaleça sobre as suas funções. Tentar agradar a todos é a melhor maneira de perder o controle sobre a situação nas comunidades e se colocar em uma posição delicada na empresa.

Ser CM é um trabalho bastante exigente, e é comum ter que cumprir suas funções em horários incomuns, fins de semana, feriados, etc. Mas também é muito bom ver o trabalho dando frutos e conquistar a confiança de uma comunidade e se divertir junto com eles. Se vocês tiverem alguma pergunta sobre a função, é só perguntar nos Comentários que eu terei prazer em responder.

J.

Teoria dos Jogos:A Mecânica dos MMOs de Hoje

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Hoje queria discutir com vocês a mecânica de jogo que existe na maioria dos MMOs.

Os MMOs são divertidos pois permitem customizações e builds diferentes. Temos classes, árvores de habilidades, atributos, itemizações, etc, tudo contribuindo para que você seja diferente do jogador do seu lado. Entretanto, há uma curva normal de desempenho, rapidamente encontrada pelos jogadores, do que é considerado “ótimo” para cada jogo.

Mas afinal, o que é necessário para um personagem ser bem-sucedido em um jogo (eliminando o fator humano, é claro)? Focando no aspecto primário dos jogos, o combate, podemos montar o esquema, como a seguir. Este triângulo básico rege a performance de um personagem na maioria dos jogos:

Toda a performance de um personagem pode ser condensada assim

DPS: É o famoso ‘dano por segundo’, e normalmente o atributo mais importante para a maioria dos jogadores. Afinal, todo mundo gosta de ver números grandes de dano. Sem DPS, os recursos se acabam, e você não consegue adequar o tempo à performance.

Tempo: O tempo é seu inimigo. Não importa se sua defesa é praticamente impenetrável mas você não consegue ferir o inimigo. Não importa o dano que você dê, se não consegue sobreviver ao longo do tempo. O tempo é a medida de equilíbrio entre recursos e o DPS.

Recursos: Todo personagem goza de recursos finitos para conseguir lutar com eficiência. Sem eles, ou você morre, ou é inútil.

  1. HP/Mana: Os recursos mais comuns e normalmente os mais importantes são HP e MP, seguindo a regrinha dos antigos RPGs de console. Mas hoje é mais complexo que isto, e nesta categoria temos munição, itens consumíveis, stamina, etc. Mas a essência é a mesma: seu personagem precisa de ‘combustível’. Sem ele, sua performance cai dramaticamente (por exemplo, magos que não conseguem lançar magias) ou você simplesmente sai do jogo (mais conhecido como “Você morreu”).
  2. Defesa: Defesa = HP. Quanto mais dano você consegue absorver, mais recursos consegue manter, o que lhe dá tempo e, consequentemente, DPS. Os debuffs normalmente entram nesta categoria, por reduzir a intensidade de danos infligidos em você.
  3. Esquiva: Prima da Defesa, afinal, melhor que absorver é não ser atingido em primeiro lugar. A esquiva é bastante eficiente na manutenção de recursos, mas costuma ser mais aleatória e se ela falha, o resultado costuma ser um personagem deitado no chão. O CC (do inglês Crowd Control) também entra nesta categoria, por impedir que o inimigo lhe cause dano.

Assim, vemos que todos os elementos acima estão interligados, e que sem uma parte do triângulo, todo o personagem desaba em combate. Os jogos lidam com estes recursos cada um à sua maneira, e jogos considerados “bons” costumam ter uma dinâmica bem aprofundada entre estes elementos, permitindo várias combinações bem-sucedidas. Um jogo que tenha estes elementos em desequilíbrio pode ser considerado “ruim”.

Os jogos “bons” equilibram estes elementos em suas várias classes, profissões ou afins. Isto gera a subdivisão de tarefas mais comum nos jogos:

  • Tanker: A função do Tanker é apanhar, e muito. Apanhar no lugar dos elementos mais frágeis de um grupo. O Tanker é o conversor de Recursos em Tempo. Normalmente, enfrentar os inimigos mais fortes (ou seja, com Recursos de HP e DPS altos) sem um Tanker não dá certo. O Tanker, assim, é um personagem muito valioso, mas que é extremamente voltado para o jogo coletivo. Normalmente, Tankers tem pouco DPS, que distorce o fator Tempo em sua evolução (ou seja, ele tem pouca eficiência em sua evolução quando está sozinho, pelo dano baixo). O bom Tanker sabe controlar seus recursos e é responsável pelo ‘aggro lock’, ou seja, que os inimigos estejam sempre focados nele, e não nos outros membros mais crocantes do grupo.
  • DPS: é o famoso ‘Glass Cannon’, ou Canhão de Vidro. O DPS é o conversor de Recursos em Dano. Costuma ter grande potencial de DPS, mas Recursos bem mais limitados. É um bom personagem para o jogo Solo, mas costuma ter dificuldades em área muito povoadas de inimigos ou com aqueles que conseguem suportar o burst inicial de dano que ele provoca. O DPS é importante em um grupo, por reduzir o tempo que o Tanker precisa absorver dano, mas precisa ser habilidoso e medir a quantidade de DPS provocado para não ‘roubar’ o aggro do Tanker, normalmente com consequências desastrosas.
  • Suporte: é a cola do time, amplificando os recursos dos outros em detrimento do seu próprio. O Suporte é o conversor de Recursos em mais Recursos, divididos entre os outros elementos do grupo. O Suporte permite que os outros personagens sejam mais eficientes em suas habilidades primárias, e que seus pontos fracos sejam minimizados. O Suporte mais comum é o Healer, o cara que cura os outros membros do grupo, mas há várias formas de suporte, na forma de Pets que agem como Tanker ou DPS (caso de summoners ou domadores), ou os que fornecem benefícios estendidos pela sua presença no grupo (buffers e debuffers).

Temos também uma quarta categoria, a dos Híbridos. Na verdade, todos os personagens são híbridos (afinal, todos causam algum dano, se quiserem, e dá para improvisar um tanker se ele não precisar apanhar por um período mais extenso). Mas os Híbridos verdadeiros são aqueles que agem com eficiência em mais de uma função, como Tanker/Suporte, ou DPS/Suporte, por exemplo. Jogos “ruins” permitem que a hibridização seja profunda e que, por isso, certas funções fiquem obsoletas, o que nunca é desejável. Ou seja, jogos “ruins” permitem que certos personagens sejam “obsoletos”, o que causa um desequilíbrio na população de personagens entre as classes.

Este resumo de certa forma burocrático é a alma do sistema de combate de 99% dos MMOs do mercado (e de grande parte de jogos em geral que tenham combate). O combate é importante porque é a atividade que normalmente mais contribui para a evolução dos personagens e que permite que as outras atividades do jogo sejam feitas, como completar missões, obter itens para uso e venda (comércio) e a criação de itens através de materiais achados nos inimigos. Além disto, o combate é a parte dinâmica do jogo, onde é preciso conhecer os inimigos, criar estratégias e trabalhar em grupo para atingir o sucesso. O bom jogo nos permite escolher entre uma gama grande de opções e de sermos especializados em uma função da forma que desejarmos, ou que sejamos híbridos sem destruir o equilíbrio entre as classes.

J.

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